Ultrapassamos três meses, desde
que o Governo do Rio de Janeiro decretou a suspensão das aulas nas escolas
públicas e privadas do Estado.
Tenho visto grandes discussões
sobre a reabertura das academias, sob a justificativa de tratar-se de atividade essencial à saúde. Não vou entrar neste mérito no momento, somente tecer um breve
comentário sobre o equilíbrio que precisamos encontrar entre a necessidade de
manutenção do isolamento social e a subsistência das pessoas que dependem deste
setor econômico. Não é um privilégio das academias, mas outros segmentos acabaram
encontrando formas de manter, ainda que diante de consideráveis baixas, um
percentual de suas carteiras de clientes. As academias, pela natureza dos
serviços que prestam, não tiveram a mesma sorte.
Nosso foco, neste post, está na
relação (existe?) entre a COVID-19 e a obesidade infantil.
Segundo dados do Ministério da
Saúde, a obesidade é o principal fator de risco entre as pessoas com COVID-19, sendo
a comorbidade presente em mais de 55% dos casos de óbitos em indivíduos com
menos de 60 anos. Se considerarmos que nos óbitos acima desta idade, as
comorbidades mais apresentadas foram cardiopatias e diabetes, provavelmente
teríamos também na faixa acima de 60 anos a identificação da obesidade como
principal fator de risco, face a conhecida relação de causa e efeito entre esta
e aquelas doenças.
É importante ressaltar que a
obesidade é responsável por mais de 4 milhões de mortes por ano, considerada
como epidemia mundial com mais de 300 milhões de pessoas obesas ou com sobrepeso.
Estudo recente aponta que
crianças acima do peso possuem 75% mais chance de serem adolescentes obesos e
adolescentes obesos têm 89% de chance de serem adultos obesos. Relatórios do
Ministério da Saúde indicam que 12,9% das crianças brasileiras de 5 a 9 anos
são obesas.
Mas onde está a relação com a
COVID-19?
Um estudo realizado com mais de
18 mil crianças nos EUA (Obesity, 2016 Nov 2. doi: 10.1002/oby.21613)
demonstrou o aumento da obesidade durante as férias escolares. O número de
crianças com sobrepeso passou de 23,3% para 28,7% e o de obesas evoluiu de 8,8%
para 11,5%. A explicação para o aumento da obesidade infantil durante as férias
é que as crianças dormem menos e têm mais atividades de horas-tela, assistindo
televisão e jogando em computadores.
Sabemos que no Brasil a Educação
Física Escolar não pode ser considerada como fator de combate a obesidade
infantil, primeiro porque, absurdamente, ainda discutimos se esta unidade
curricular deve ou não ser ministrada por profissionais especialistas na área;
segundo porque não existe uma política para esse fim; terceiro porque as aulas
de Educação Física, quando existem nas escolas de educação infantil e nos anos
iniciais do ensino fundamental, não garantem o mínimo de continuidade para um
programa de atividades físicas regulares e sistemáticas na escola.
Mas a simples rotina imposta pela
escola, com horários para acordar e dormir, comer, estudar, tarefas de casa,
além das crianças que têm o privilégio de participar de atividades desportivas
fora da escola, já são fatores que diminuem o tempo diário de imobilismo.
O que podemos esperar destes mais de 90 dias sem escola, sem atividades físicas extraclasse, sem horário para acordar, dormir e comer? O tempo inteiro de frente para o computador estudando (algumas), jogando, batendo papo, se empanturrando de biscoitos, refrigerantes e doces?
Não precisa nem fazer pesquisa
(será imprescindível que as façamos!!!) para afirmar que os efeitos da pandemia
da COVID-19 sobre os índices de obesidade infantil serão catastróficos.
Os efeitos deletérios da
suspensão das atividades físicas e rotineiras das crianças serão sentidos por
gerações. Se hoje a obesidade mata mais de 4 milhões de pessoas no mundo, como
ficará esse número diante do considerável aumento de casos de obesidade
infantil?
Precisaremos realizar campanhas
de conscientização da sociedade. Mais uma vez a Educação Física Escolar se
mostra como caminho mais eficiente e barato para lidar com questões como o da pandemia
(já é!!!) de obesidade. Para isso, precisamos assumir nosso papel como verdadeiramente
profissionais da saúde, dentro da escola.
Se tivéssemos menos obesos, pelo que tudo indica, teríamos um número bem menor de óbitos pela COVID-19 no Brasil e no mundo. Se tivéssemos realizado uma campanha de orientação e conscientização dos pais de nossas crianças durante a pandemia causada pelo corona-vírus, provavelmente teríamos menos crianças obesas, depois dos períodos de quarentena.
Voltamos ao ovo e a galinha.
Sem terceirizar responsabilidades,
talvez nossos Conselhos pudessem (e ainda podem) ter um papel importante nessa
campanha. Afinal, a principal função de qualquer autarquia corporativa é
garantir a melhor prestação de serviços à sociedade.
Saudações.